sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Vice de Bolsonaro defende nova Constituição sem Constituinte

Para Mourão, Constituição atual, de 1988, deu início à crise pela qual passa o país



13.set.2018 às 22h26

CURITIBA e SÃO PAULO
Estelita Hass Carazzai
Rodrigo Vizeu

Candidato a vice de Jair Bolsonaro (PSL), o general Hamilton Mourão (PRTB) defendeu nesta quinta-feira (13) que o país faça uma nova Constituição, mais enxuta e focada em "princípios e valores imutáveis", mas não necessariamente por meio de uma Assembleia Constituinte.

Para ele, o processo ideal envolveria uma comissão de notáveis, que depois submeteria o texto a um plebiscito, para aprovação popular —algo que, atualmente, não se enquadra nas hipóteses previstas em lei.

"Essa é a minha visão, a minha opinião", disse, destacando que essa não é a proposta da candidatura, nem de Bolsonaro. "Uma Constituição não precisa ser feita por eleitos pelo povo."

Atualmente, a única forma de se alterar a Constituição é por meio de uma emenda constitucional, que precisa ser aprovada por três quintos do Congresso. O candidato a vice não deu detalhes de como seria formada a comissão de notáveis, mas a proposta só seria possível, dentro da lei, se o Congresso assim o aprovasse.

Mourão, que deu uma palestra a empresários em Curitiba, defendeu que a ideia não é antidemocrática, e disse que já houve Constituições no Brasil que vigoraram sem terem passado pelo Congresso.

"Não em ditadura; em período democrático. A Constituição de 1946, lembra como ela foi feita", afirmou.

De acordo com o constitucionalista Luiz Guilherme Arcaro Conci, professor da PUC-SP, porém, a Constituição de 1946, a que se referiu o candidato, foi, sim, feita pelo Congresso.

Questionado posteriormente pela Folha, Mourão afirmou que pode ter se confundido ao citar a Constituição de 1946.

Os textos que não passaram por representantes eleitos pela população foram os de 1824, 1937 e 1969, que não coincidem com regimes democráticos no Brasil.

Para Mourão, a atual Constituição, de 1988, deu início à crise pela qual passa
o país.

"Tudo virou matéria constitucional. A partir dela, surgiram inúmeras despesas. A conta está chegando, está caindo no nosso colo. Chegou o momento em que temos que tomar uma decisão a respeito", afirmou.

Mourão, porém, reconheceu que a edição de uma nova Constituição é algo "muito difícil de se conseguir" nesse momento no Brasil.

O general ainda rechaçou a possibilidade de intervenção militar no Brasil, e disse que a democracia precisa ser "afirmada como um valor fundamental do nosso país".

"Por pior que seja esse sistema, ele ainda é o melhor de todos", declarou.

FONTE: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/09/vice-de-bolsonaro-defendenova-
constituicao-sem-constituinte.shtml

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Minucioso, livro "Medo" descreve governo Trump como bomba-relógio

Em nova obra, Bob Woodward narra pensamentos alheios e retrata presidente como ignorante


Patrícia Campos Mello



Se Donald Trump, não tivesse um grave déficit de atenção e uma péssima memória, nós estaríamos na Terceira Guerra Mundial. É isso que se depreende do livro "Fear:Trump in the White House"("Medo:Trump na Casa Branca"), do jornalista Bob Woodward, lançado nesta terça (11) nos EUA e que chega em outubro ao Brasil pela editora Todavia.

No livro, Woodward relata o esforço concentrado de alguns assessores do presidente dos EUA para salvá-lo de si mesmo e impedir que faça grandes bobagens, tais como: sair do acordo comercial com a Coreia do Sul, sair da Otan (a aliança militar encabeçada pelos EUA), assassinar o ditador Bashar al-Assad, da Síria, tuitar mandando todos os soldados americanos saírem da Coreia do Sul, sob pena de deflagrar um ataque de Pyongyang.

Algumas vezes, é bom dizer, eles fracassam —vide a reação de Trump aos protestos em Charlottesville em que ele igualou manifestantes contrários ao racismo a neonazistas. Ou a tentativa infrutífera de impedir que Trump fique cinco horas por dia assistindo ao noticiário na TV e que use o Twitter como megafone.

Mas, segundo o livro, a incapacidade de Trump de prestar atenção —não lê nem ouve briefings de segurança, esquece ordens que deu, volta atrás em decisões— é que acaba impedindo o presidente de fazer estragos maiores.

Gary Cohn, que foi o principal assessor econômico de Trump, e Rob Porter, ex-secretário pessoal do presidente, rotineiramente retiravam da mesa do republicano documentos com ordens que ele decidia intempestivamente. 

Na maioria das vezes, Trump nem reparava no sumiço e nunca mais falava no assunto. Os dois também filtravam que tipo de informação podia chegar até Trump. Era um "golpe de Estado administrativo". 

Porter e Cohn, os personagens que mais aparecem no livro, já vieram a público criticar a obra, mas de forma pouco específica. Porter nega que documentos tenham sido "roubados" da mesa de Trump e que ele tenha tentado "proteger" o presidente de certos pontos de vista considerados nocivos, e Cohn diz que o livro não retrata sua experiência no governo.

Woodward também cita em detalhes diálogos surrealistas entre Trump e os assessores.

Ouvindo Gary Cohn falar que as taxas de juros, que estavam baixas e iam começar a subir, Trump teria sugerido: 

"Vamos pegar um monte de dinheiro emprestado agora, esperar, vender depois e ganhar um monte de dinheiro".

Cohn, segundo o livro, ficou "chocado com a falta de compreensão básica de Trump" e tentou explicar que, dessa maneira, aumentaria o déficit do governo.

Ao que Trump teria retorquido, ignorando como se produz inflação: "Como assim? É só imprimir dinheiro".

O livro também relata o processo de contratação de Trump —anunciar pelo Twitter o novo ministro ou secretário antes de ele aceitar e se orientar por fatores estéticos. Não gostou, por exemplo, se seu ex-conselheiro de Segurança Nacional H.R. McMaster porque estava vestido como "vendedor de cerveja" e de John Bolton, o atual, por causa de seu bigode.

Não fosse o autor o respeitado Bob Woodward, o leitor poderia achar que ele instalou microfones em todos os participantes. Foi Woodward que revelou, ao lado de Carl Bernstein, o escândalo de escutas Watergate, que levou à renúncia de Richard Nixon em 1974 (a investigação é relatada no livro "Todos
os Homens do Presidente", que no Brasil é publicado pelo selo Três Estrelas, do Grupo Folha).

O nível de detalhes em "Fear" é impressionante, além de ele tentar relatar o que os personagens sentiram a cada momento. Para os críticos, é o chamado "jornalismo mãe Dinah", de poderes mediúnicos.

Woodward diz que faz as entrevistas em "deep background" (pode-se usar toda a informação, desde que não se identifique a fonte) e afirma ter "centenas de horas de entrevistas com participantes e testemunhas desses acontecimentos". Ele usou o mesmo método em seus outros livros sobre presidentes —Barack Obama, Bill Clinton e George W. Bush, o que mostra impressionante acesso ao poder. 

Em Washington, a "lei de Woodward" costuma ser respeitada: se não quiser ser destruído, sente para falar com Woodward e dê sua versão dos fatos, senão outros darão.

FONTE:
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2018/09/minucioso-livro-medodescreve-
governo-trump-como-bomba-relogio.shtml