quarta-feira, 20 de março de 2013
Entrevista de Julian Assange com Noam Chomsky e Tariq Ali
[OFF] Eu sou Julian Assange. Editor do Wikileaks. Nós revelamos os segredos do
mundo. Esses documentos pertencem ao governo americano. Fomos atacados pelos
poderosos. Os Estados Unidos condenam fortemente... Ei, pare de fazer perguntas!
Ele infringiu a lei. Atirem ilegalmente no filho da... Há 500 dias eu estou detido sem
acusação, mas isso não nos deteve. Hoje estamos em busca de ideias
revolucionárias que podem mudar o mundo amanhã.
Durante os últimos dois anos, novas formas de revolução têm surgido. Hoje, eu
converso com dois gigantes da esquerda intelectual. Noam Chomsky, renomado
linguista e pensador rebelde. Tariq Ali, romancista de revoluções e historiador
militar.
Eu quero descobrir o que esses dois ativistas de peso pensam. Para onde o mundo
está indo? Para onde deveria ir?
JA
Noam, Tariq. Os anos de 2011 e 2012 têm sido históricos para os movimentos de
libertação em muitos lugares ao redor do mundo. Vocês previram isso?
TA
Eu não previ. Acho que a maioria das pessoas não previu. Mas o que é interessante
é que essas revoltas árabes acontecem em uma parte do mundo sobre a qual os
comentaristas diziam “as pessoas não estão interessadas em democracia, os
muçulmanos são geneticamente hostis à democracia.” E aí houve essas revoltas e
elas se espalharam, porque foi a ocupação da Praça Tahrir no Cairo que inspirou
ativistas ao redor dos Estados Unidos, até na Rússia. Quem iria esperar que esses
movimentos, de repente, fossem surgir na Rússia e desafiar as autoridades? A
Primavera Árabe tem sido contagiante e ainda continua de diferentes maneiras.
JA
Noam Chomsky.
NC
Não, eu não posso dizer que eu previ isso. Eu presumi que cedo ou tarde teria de
acontecer uma reação popular à amarga guerra de classes que foi travada pela
geração passada, e uma guerra de classes bastante consciente, pelos empresários, que são sempre muito conscientes de seus interesses... Sentiram realmente que
estavam em seu papel. Nos Estados Unidos, por exemplo... Bem, nós conhecemos os
fatos, durante a geração passada a riqueza foi criada, mas foi para pouquíssimos
bolsos. Agora, a extrema desigualdade dos Estados Unidos é carregada por
literalmente um décimo da população, principalmente os diretores de hedge funds,
os presidentes das grandes empresas e assim por diante. Nós estamos falando dos
Estados Unidos, mas o fenômeno é global. Vamos dizer, o Egito, um dos lugares
mais interessantes. O movimento que começou com as manifestações na Praça
Tahrir um ano atrás é chamado de Movimento 6 de Abril. Existe um motivo. 6 de
abril de 2008 foi o dia de protestos trabalhistas de larga escala nas grandes
instalações industriais no Egito, apoiando as manifestações e assim por diante.
Tinha um pequeno grupo de profissionais com experiência em tecnologia que
tentou... Que queria participar e ajudá-los com as mídias sociais. Os protestos
foram esmagados pela ditadura, mas o grupo de profissionais é o Movimento 6 de
Abril, eles mantiveram o nome. Essa é a indicação do quanto esses protestos estão
profundamente enraizados... Sim, teve pessoas prontas... Muita gente... Para muitos
foi só um momento de... Uma abertura na qual nós poderíamos fazer algo, de algum
jeito. Mas teve muita preparação para isso, e algo similar na Tunísia. Você
perguntou se eu previ isso. Não, eu não previ. Mas agora está acontecendo ao redor
do mundo todo, de um jeito ou de outro.
JA
Tariq?
TA
Acho que Noam está certo e acho que, em essência, o que temos testemunhado,
junto com a economia neoliberal, é a redução da política no sentido que eu tenho
discutido já há algum tempo, de que o que temos na política ocidental não é a
extrema esquerda e nem a extrema direita mas um extremo centro. E esse extremo
centro engloba tanto a centro-direita quanto a centro-esquerda, que concordam
em fundamentos: travando guerras no exterior, ocupando países e punindo os
pobres, punindo por meio de medidas de austeridade. Não importa qual o partido
no poder, seja nos Estados Unidos ou no mundo ocidental... As coisas, sabe,
continuam como antes. Existe uma continuidade de um regime para outro que
afeta o funcionamento da mídia, que se tornou cada vez mais limitada. Há pouca
diversidade, pouquíssimos debates construídos dentro da mídia. E essa é uma
grande característica agora, é uma forma... É uma ditadura do capital que é
exercida por esse extremo centro. Os países árabes tiveram ditadores apoiados
pelo Ocidente por algum tempo, e a velocidade e a escala dessas revoltas
certamente surpreendeu a todos. Nenhum de nós poderia ter previsto isso.
JAVocê acha que a falta de previsibilidade na verdade é parte do motivo deles terem
conseguido sucesso?
TA
Sem dúvida.
JA
Se elas pudessem ser previstas, poderia se haver criado mecanismos para impedir
que acontecessem?
TA
Sim. E mecanismos bem extremos. Eles teriam tentado prender pessoas, esmagar
pessoas, torturar pessoas, prender ativistas, mas ficou fora de controle muito
rapidamente e os Estados Unidos e a França não poderiam controlar isso na
Tunísia e no Egito, por exemplo. Quer dizer, foram surpreendidos também. Só se
juntaram para agir para tentar subverter o processo quando fizeram o bombardeio
de seis meses na Líbia pela OTAN. Para que eles pudessem ter algum controle
sobre o mundo árabe de novo. Mas é ainda incrivelmente inconstante e, sabe,
algumas vezes as pessoas falam "mas nada mudou muito". Isso é verdade. Mas uma
coisa que mudou é que as pessoas, as massas, perceberam que para fazer a
mudança elas precisam se mexer e se tornar ativas. E essa é uma grande lição das
revoltas.
JA
Eu quero considerar se realmente existem opções. É ilusório pensar que há opções
ou os novos regimes têm que lidar com a situação ao redor deles, as básicas
restrições em lidar com outras nações? Você, por exemplo, sabendo que Cuba está
a 145 km de Miami, a 145 km de uma superpotência agressiva, que está
transmitindo propaganda em Cuba, estabeleceria a censura? Você introduziria uma
política de Estado para prevenir a destituição da independência de Cuba? Porque
parece para mim que essas são as questões que vão ter de ser enfrentadas pelas
nações que estão lutando, não somente para derrubar seus governantes, mas para
se tornarem independentes dos poderes do Ocidente.
NC
Bem, o caso de Cuba é muito especial. Então eu não... Quero dizer, até certo ponto,
esse caso tem as mesmas características de outros países pequenos, mas é um caso
único. Por 50 anos os Estados Unidos tem se dedicado a estrangular e esmagar
Cuba. E o conselheiro de Kennedy para a América Latina disse: "O problema é a
ideia de Castro de tomar as coisas pelas próprias mãos, o que pode levar outros,
em circunstâncias similares, a tentar seguir esse caminho e assim, em breve, todo o
sistema de controle dos EUA vai erodir." Então, por essas razões, que persistem, os Estados Unidos continuou com uma enorme campanha do terror. Cuba tem sido
vítima de mais terrorismo que, provavelmente, o mundo todo junto, terrorismo
internacional. E, além disso, estrangulação econômica, de uma forma
extraordinária. Se você é uma população que quer ser independente, que quer ser
um Estado independente - nós podemos falar sobre outras formas de
independência mais tarde - mas um Estado independente que desafie a OTAN, ou
se você está perto da China, em desafio com a China, ou a Rússia para algumas das
ex-repúblicas soviéticas... Então passa a ter um custo. No caso de Cuba, talvez o
custo seja estar em um estado de guerra. Você olha ao redor do mundo e há
problemas similares, mas não tão terríveis quanto os que Cuba enfrenta. Vá um
pouco mais para o sul, na América do Sul. Um dos mais dramáticos e importantes
desenvolvimentos da última década é o da América do Sul. Pela primeira vez desde
que os colonizadores europeus chegaram lá, pela primeira vez em 500 anos, a
América do Sul fez um movimento muito significativo para sua independência,
para sua integração. Não existe mais nenhuma base militar americana na América
do Sul, o que é bastante notável.
JA
O que você acha, Tariq?
TA
Bem, eu acho que no decorrer das últimas décadas as mudanças mais importantes
que temos visto vêm da América do Sul. Eu visitei a Venezuela, a Bolívia, o Brasil...
e o clima é simplesmente outro. Muitas pessoas dizem: "É a primeira vez que nós
nos sentimos realmente independentes". Qualquer que seja a fraqueza desses
regimes - e existem algumas - eles são Estados soberanos e agem como tal. E
quando Chavez, por exemplo, diz algo aos Estados Unidos, ele é muito franco e
aberto sobre isso. Ele me disse uma vez: "Eu fiz um discurso na ONU e muitos
outros países que não podem falar aquilo em público vieram até mim e me
parabenizaram. Disseram: 'obrigado, você está falando por todos nós'". E ele disse:
"Eu disse a eles: 'mas vocês podem falar também. Ninguém pode impedi-los'", mas,
sabe, a...
JA
Bom, obviamente eles acham que não podem falar.
TA
Eles acham que não podem. Esse agora é um modelo na maior parte da América do
Sul, com exceção da Colômbia, México e o Chile, parcialmente. Em qualquer outro
lugar, as pessoas estão sentindo que são independentes pela primeira vez na
história. Eu acho que isso vai ser um problema enorme para os Estados Unidos.
Eles estão obcecados com o mundo árabe e com a China, e agora com o Irã, mas na América do Sul, por uma década ou pouco mais, os Estados Unidos não estão no
controle.
NC
Isso os preocupa demais. Na verdade, o Conselho de Segurança Nacional, uma
organização de planejamento de elite, avisou que se o Estados Unidos não
controlassem a América Latina, como eles iriam impor uma ordem bem-sucedida
para o resto do mundo? Querendo dizer comandar o resto do mundo. Então, "se
não conseguimos controlar nem o nosso quintal, como vamos controlar o resto?"
Agora, existe uma questão mais profunda. Indo para o Oriente Médio: a maior
preocupação dos Estados Unidos e de outras potências imperiais tradicionais -
Reino Unido e França, particularmente -, a preocupação é de que agora eles
possam... Que o Oriente Médio fique fora de controle. E isso é sério, muito mais
sério do que a América do Sul.
TA
Eu concordo. É por isso que eles invadiram a Líbia, Noam, eu não tenho dúvida. Foi
para reestabelecer o controle.
NC
Eu concordo, mas acho que isso está em todos os lugares. Por exemplo, se você for
olhar o que aconteceu na Primavera Árabe, os países que são cruciais para o poder
imperial do Ocidente - os produtores de petróleo - foram colocados sob uma mão
muito forte. Na Arábia Saudita, no Kuwait, nos Emirados Árabes, as regiões que
mais produzem petróleo, a Primavera Árabe nunca saiu do papel. A intimidação
das forças de segurança, apoiada pelo Ocidente, foi tão enorme que as pessoas
estavam literalmente com medo de sair nas ruas em Riyadh. O Ocidente -
principalmente a França na Tunísia e os Estados Unidos e o Reino Unido no Egito -
estão seguindo um padrão bastante tradicional. Existe uma cartilha que você
obedece e te dá um tipo de plano de jogo quando alguns dos seus ditadores
favoritos perdem a capacidade de governar, o que você faz é apoiá-los até o último
minuto possível. Quando já não é mais possível – talvez o Exército se volte contra
eles – você faz com que sua classe intelectual comece a emitir declarações sobre
democracia, e então você tenta recuperar o velho sistema, o quanto for possível –
como foi feito com Samosa, Marcos, Duvalier, Mobutu, Suharto. Quer dizer, é uma
rotina. Não precisa ser um gênio para ver isso.
TA
Mas eu acho que o problema real, Julian, é que a democracia em si está em um
grande problema, por causa das corporações. Quando você tem dois países
europeus, quando você tem a Grécia e a Itália, os políticos abdicando e dizendo
"deixem os banqueiros comandar"... Quer dizer, para onde isso está indo? O que nós estamos testemunhando é que a democracia está se tornando cada vez mais
despida de conteúdo. É como uma concha vazia, e é isso que está revoltando a
juventude, ela sente que faça o que fizer, vote em quem votar, nada vai mudar. Daí
todos esses protestos.
JA
E você acha que esse problema é a mídia, é estrutural, é o aumento da capacidade
do centro controlar a periferia, como resultado de telecomunicações mais
sofisticadas? O que está causando isso?
TA
O que está causando isso... A democracia que se tornou petrificada. Mas a mídia
tem se tornado um pilar central do sistema, muito mais agora do que na Guerra
Fria. Naquela época, eles estavam provando aos russos e aos chineses que "nosso
sistema é melhor que o de vocês". Agora eles não sentem que têm de provar nada,
então podem agir como quiserem, ponto final.
JA
Eles estavam usando a liberdade de expressão como um porrete para bater na
União Soviética e agora não há necessidade disso. Eu acho... Você teve esse tipo de
aliança entre liberais e militares e a elite no Ocidente, todos se juntando por
interesses em comum para mostrar a superioridade do Ocidente se comparado aos
soviéticos. Esse tipo de aliança muito artificial agora está rompida.
TA
a) está rompida, e b) dentro do mundo ocidental eles agora têm as coisas sob
controle a tal ponto que eles literalmente conseguem sair impunes de assassinatos.
Quer dizer, Obama assinou uma lei agora segundo a qual o presidente americano
tem o direito de autorizar a morte de um cidadão americano sem qualquer recurso
à lei. Sem o devido processo legal, o que nenhum outro presidente na história dos
EUA tinha feito... Mesmo durante a Guerra Civil, as pessoas que tentaram matar
Lincoln, ou que mataram Lincoln, os conspiradores, foram julgados em um
tribunal, por mais criminosos que fossem. Mas não mais - agora você pode ordenar
a morte de alguém. E esse ataque às liberdades civis é, claro, extremamente
perturbador porque realmente afeta a democracia.
JA
Você acha que esses movimentos sociais que estão acontecendo na América
Latina... Se você olhar para o tipo de avanço tecnológico na América Latina, é algo
como aconteceu nos EUA nos anos 70... A interação política e social que acontece nesses Estados é resultado das interações tecnológicas que estão acontecendo?
Então, talvez seja simplesmente impossível para um país mais industrializado
adotar o modelo de um país menos industrializado... Nós teríamos que nos livrar
da industrialização para fazê-lo?
TA
Eu acho que não. A maior parte desses Estados ocidentais ficaram muito felizes em
se tornarem desindustrializados e fazer da China a potência econômica dominante
no mundo, como os britânicos eram no século 19. Quer dizer, a China é a fábrica do
mundo... Houve um grande aumento... A atual força de trabalho, embora em
declínio no Ocidente, triplicou de um bilhão nos anos 70 e 80 para mais de três
bilhões hoje, por causa do que está acontecendo na China, Índia e em partes da
América do Sul. Então acho que as chamadas potências avançadas têm muito a
aprender com as coisas boas que têm acontecido na América do Sul, por que não?
JA
Noam, existe um modelo? Um modelo de funcionamento prático?
NC
Bem, eu acho que... Eu concordo com Tariq - existem muitos modelos - mas o... Eu
não acho que as potências populares preocupadas em mudar suas próprias
sociedades deveriam procurar modelos. Eu acho que elas deveriam criar os
modelos. E é exatamente isso que está acontecendo. Então os modelos na América
do Sul, vamos dizer, progrediram bastante. Eles estão desenvolvendo modelos na
Bolívia, que você mencionou algumas vezes. Uma das coisas mais marcantes que
aconteceu lá foi que a parte mais reprimida da população naquele hemisfério, a
população indígena, chegou à arena política. Na verdade, ela chegou ao poder
político e está lutando pelas suas próprias questões. Isso também está acontecendo
no Equador e, em certo nível, no Peru. Bem, eles estão desenvolvendo modelos
novos e significativos e é melhor o Ocidente captar rápido alguns aspectos desses
modelos, ou então ele irá ser derrubado e vai se acabar.
JA
Nós sempre tivemos a máxima de que "capitalismo e democracia andam juntos", e
a China parece ser um ótimo exemplo de maior eficiência em ser um Estado
capitalista do que um Estado democrático.
TA
Bem, eu nunca acreditei que o capitalismo e a democracia andassem juntos. Os
chineses mostram que hoje o país capitalista mais bem sucedido no mundo não tem um pingo de democracia no seu funcionamento. Mas até historicamente,
durante centenas de anos de existência do capitalismo, ele funcionou sem a
democracia até o começo do século 20. Quer dizer, as mulheres só puderam votar
depois da Primeira Guerra Mundial. Então o que combina perfeitamente com o
capitalismo é uma não-democracia ou uma democracia truncada. E essa noção de
que capitalismo e democracia estão juntos foi uma construção da Guerra Fria feita
para esmagar os russos, os europeus do leste e os chineses. Não tem base em fatos
históricos.
JA
Noam?
NC
Primeiro de tudo, nós não temos sociedades capitalistas, nós temos uma ou outra
variedade de capitalismo de Estado, e isso é verdade onde quer que o sistema
industrial funcione. Então, por exemplo, nos EUA o papel do Estado na economia é
enorme. Quer dizer, vamos pegar o que nós três estamos fazendo agora. Isso é
baseado na revolução tecnológica... Computadores, internet, satélites, microeletrônica e assim por diante... Agora, a maior parte disso tudo foi desenvolvida no
setor estatal. Na verdade, exatamente onde eu estou sentado, no MIT. Foi um dos
lugares onde essas coisas foram desenvolvidas nos anos 50 e 60, a maior parte sob
o financiamento do Pentágono. Houve financiamento, subsídio, invenção, criação,
também aquisição... Por décadas. Isso no setor estatal antes de serem transferidos
para o capital privado para comercialização e lucro. E se nós voltarmos...
JA
Esse progresso tecnológico... Na década de 30 - a partir da literatura daquela época
- você via muito os soviéticos falando sobre como o sistema deles era
simplesmente mais eficiente, e, portanto, como um sistema industrial eficiente, ele
iria predominar. Você também via os nazistas falando precisamente nos mesmos
termos, de que esse investimento massivo em tecnologia estava produzindo uma
indústria eficiente e iria simplesmente dominar outras forças ao redor. Essa não é
uma restrição ideológica básica? A de que independentemente do sistema que você
queira, que as pessoas queiram... Talvez um dia todos nós sejamos bons com os
outros, pra variar. Algo muito, muito básico... Simples decência humana. Mas se
esse sistema não for eficiente em relação a outro sistema, o outro sistema irá
simplesmente crescer em escala até que predomine...?
TA
Bem, eu... Ele irá, mas somente se crescer militarmente. Veja, os Estados Unidos é
fraco economicamente no momento atual... Está com uma dívida enorme, como
Noam ressaltou. É uma crise estrutural real, mas ele é bastante dominante militarmente, e usa seu poderio militar para dominar outras partes do mundo, que
podem estar indo bem economicamente, mas que não têm esse poder. Esse é o
problema que enfrentamos.
JA
Então, esse conflito é entre... O desejo de fazer alguma coisa por razões ideológicas
e uma espécie de realidade prática em que, digamos, o capitalismo totalitário pode
ser simplesmente o sistema mais eficiente e, portanto, irá predominar.
NC
Não é um sistema eficiente. Dê uma olhada na China. O crescimento da China tem
sido espetacular, mas... A China tem crescido em grande parte como uma fábrica de
montagem. Ela é principalmente a fábrica de montagem para países de indústria
avançada que estão em sua periferia: Japão, Taiwan, Coreia do Sul. Então, tomando
como exemplo, vamos dizer, a Foxconn, uma fábrica enorme e horrível na China
onde as condições de trabalho são grotescas. É uma fábrica de propriedade de
Taiwan e produz computadores Apple, iPods, computadores Dell... O que tem
acontecido nos últimos anos é que a China tem sido a linha de montagem para os
países avançados do Estado capitalista industrial na sua periferia, e para
multinacionais ocidentais. Agora é claro, mais cedo ou mais tarde, a China vai
começar a subir na escala tecnológica. Na verdade, em alguns aspectos, isso já está
acontecendo. #A China, na verdade, começou a inovar com a tecnologia de energia
solar que supera outra em qualquer lugar. E isso vai começar a acontecer em todo
o lugar, mas é um processo longo e lento.
JA
Tariq, tanto você quanto Noam têm uma vida longa como ativistas. Quando você
olha para essa geração de ativistas de agora, no Ocidente, que está apenas
começando a ser politicamente radical, penso que "juventude radical na internet" é
provavelmente a melhor maneira que vejo de descrevê-los... O que vocês querem
dizer a eles? Que experiência vocês tiveram durante essas múltiplas batalhas
durante tantos anos que podem passar para eles? Porque me parece que houve um
momento, nos anos 80 e 90, em que não havia uma continuidade dessa tradição de
dissidentes no Ocidente. Tariq?
TA
Eu tento evitar dar conselhos para gerações mais novas porque gerações são tão
diferentes umas das outras, e considerando que o mundo tem mudado tanto, o
único conselho universal a ser dado é: não desistam. Você vive por momentos
ruins e sente que tudo está perdido, e muitas pessoas se tornam passivas, mas a passividade geralmente leva ao desespero. E eu acho que é extremamente
importante para os jovens crescendo hoje que eles percebam a necessidade de
serem ativos. E atividade é algo que leva à esperança, e a não ser que eles sejam
ativos, ninguém vai dar nada de mão beijada. Essa é a lição dos últimos anos dessa
nova radicalização. Não desistam. Tenham esperança. Permaneçam céticos. Sejam
críticos com o sistema que tem nos dominado. E mais cedo ou mais tarde, se não
essa geração, então nas próximas, as coisas vão mudar.
JA
Noam?
NC
Bem, muitas coisas mudaram durante os anos. Muitas mudaram para melhor,
mudaram porque muitas pessoas dedicadas se comprometeram com isso. E a
história não acabou. Existem mudanças pela frente e nós podemos fazer algo com
elas. E, na verdade, existem muitos problemas sérios. Por exemplo, se as coisas
seguirem no curso atual, nós provavelmente vamos encarar a destruição da
possibilidade de qualquer sobrevivência decente, simplesmente por causa de
coisas como o uso de combustíveis fósseis. Agora, essa é uma questão
extremamente séria, é como os lemingues se atirando do precipício, como um
suicídio coletivo.
Tradução e legendas: Jessica Mota
Agência Pública - apublica.org
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