Na arena católica, o poder fraciona-se, assimetricamente, entre pelo menos sete polos: o pontifício; o cardinalício; o episcopal-clerical; o burocrático-central; o das ordens e das congregações religiosas; o dos leigos e dos movimentos; o da sociedade civil intra-eclesiástica. Neste primeiro artigo de uma série escrita pelo jornalista Dermi Azevedo, o tema é o polo pontifício.
Dermi Azevedo

Classificado pelo historiador Arnold Toynbee como “a instituição mais popular do Ocidente”, o Papado permanece, há séculos, como ator destacado no cenário internacional. Com o seu discurso encoberto pela linguagem de caráter religioso, a cúpula da Igreja não consegue disfarçar uma realidade humana: a da luta e da disputa pelo poder.
No momento em que um papa renuncia e outro é eleito por um colégio eleitoral com apenas 115 cardeais votantes, a opinião pública mundial divide-se diante do significado desses acontecimentos e nunca fica indiferente.
Na arena católica, o poder fraciona-se, assimetricamente, entre pelo menos sete polos: 1) o polo pontifício; 2) polo cardinalício; 3) o polo episcopal-clerical, representado pelos bispos e pelos demais clérigos; 4) o polo burocrático-central, concentrado na Cúria Romana; 5) o polo das ordens e das congregações religiosas; 6) o polo dos leigos e dos movimentos; 7) o polo da sociedade civil intra-eclesiástica.
O polo pontifício
O polo pontifício é o principal ponto de referência da Igreja Romana. O papa é, ao mesmo tempo, o bispo de Roma e o “primus inter pares” no conjunto do episcopado mundial.
O Código do Direito Canônico, promulgado em 28 de janeiro de 1983 (e que representa a lei fundamental da Igreja), define o papa como sucessor do apóstolo Pedro, “cabeça do colégio dos Bispos, Vigário de Cristo e Pastor da Igreja Universal, tendo, em virtude de sua missão, o poder ordinário, supremo, pleno, imediato e universal, que pode sempre exercer livremente” (Can. 333).
A ele compete dirigir o Colégio dos Bispos em sua condição de “sujeito de poder supremo e pleno” (Can 336). O colégio ou corpo episcopal “não pode ser exercido senão com o consentimento do romano pontífice”.
Dentro e fora da Igreja Romana, a instituição do papado continua a ser influente inclusive como um fenômeno midiático. O núcleo originário da ação pastoral do papa sempre esteve marcado por determinadas circunstancias históricas, que o modificaram. Originariamente, o papa exercia o seu ministério em sua condição de bispo da Igreja local de Roma. Não havia um modelo pontifício único.
Em seu conflito com o imperador germânico, o Papa Gregório VII apontou, no documento “Dictatus Papae” , em 1075, alguns poderes pontifícios : “nenhum texto canônico existe fora de sua autoridade; sua sentença não pode ser reformada por ninguém e ele sozinho pode reformar a sentença de todos; ele não deve ser julgado por ninguém”.
O Concilio Vaticano II definiu, como prerrogativas do papa, a sua jurisdição universal imediata, ordinária, plenária e suprema e a sua infalibilidade quando fala “ex cathedra”. Ou seja, quando fala na sua condição de Pontífice Romano, como pastor e como doutor.
Quanto aos títulos, o papa, como já foi dito, é o bispo de Roma, o chefe da Igreja, o sumo pontífice (nome herdado do “Pontifex maximus”, do Império Romano); o vigário de Cristo e soberano do Estado da Cidade do Vaticano. Ele possuía também o título de Patriarca do Ocidente, abolido no governo de Paulo VI.
Texto do “Dictatus Papae”, de 1075:
I. «Quod Romana ecclesia a solo Domino sit fundata». (Que a Igreja Romana foi fundada somente pelo Senhor).
II. «Quod solus Romanus pontifex iure dicatur universalis». (Que só o Pontífice Romano seja dito legitimamente universal).
III. «Quod ille solus possit deponere espiscopus vel reconciliare». (Que só ele possa depor ou repor bispos).
IV. «Quod legatus eius omnibus episcopis presit in concilio etiam inferioris gradus et adversus eos sententiam depositionis possit dare». (Que os seus legados, ainda que de grau inferior, em um concílio estão acima de todos os bispos, e pode contra estes pronunciar sentença de deposição).
V. «Quod absentes papa possit deponere» (Que o Papa possa depor ausentes).
VI. «Quod cum excommunicatis ab illo inter cetera nec in eadem domo debemus manere». (Que com os excomungados pelo Papa não podemos, entre outras coisas, permanecer na mesma casa).
VII. «Quod illi soli licet pro temporis necessitate novas leges condere, novas plebes congregare, de canonica abatiam facere et e contra, divitem episcopatum dividere et inopes unire». (Que só a ele é lícito, segundo necessidade temporal, ditar novas leis, formar novas comunidades, converter uma fundação em abadia e, reciprocamente, dividir uma diocese rica e reunir dioceses pobres).
VIII. «Quod solus possit uti imperialibus insigniis». (Que só ele possa levar as insígnias imperiais).
IX. «Quod solius pape pedes omnes principes deosculentur». (Que todos os príncipes devem beijar os pés do Papa).
X. «Quod illius solius nomen in ecclesiis recitetur». (Que o seu nome deve ser recitado em toda igreja).
XI. «Quod hoc unicum est nomen in mundo». (Que este nome é único no mundo).
XII. «Quod illi liceat imperatores deponere». (Que lhe seja lícito depor os imperadores).
XIII. «Quod illi liceat de sede ad sedem necessitate cogente episcopos transmutare». (Que lhe seja lícito trasladar bispos de uma sede para outra, se lhe obrigar a isso a necessidade).
XIV. «Quod de omni ecclesia quocunque voluerit clericum valeat ordinare». (Que possa ordenar clérigos de qualquer igreja onde queira).
XV. «Quod ab illo ordinatus alii eclesie preesse potest, sed non militare; et quod ab aliquo episcopo non debet superiorem gradum accipere». (Que um ordenado por ele possa presidir a outra igreja, mas não servi-la; e que o ordenado por ele não possa receber grau superior de outro bispo).
XVI. «Quod nulla synodus absque precepto eius debet generalis vocari». (Que nenhum sínodo se chame universal se não for por ordem do Papa).
XVII. «Quod nullum capitulum nullusque liber canonicus habeatur absque illius auctoritate». (Que nenhum capítulo nem nenhum livro seja considerado como canónico sem sua autorizada e permissão).
XVIII. «Quod sententia illius a ullo debeat retractari et ipse omnium solus retractare possit». (Que suas sentenças não sejam retratadas por ninguém e só ele possa revê-la).
XIX. «Quod a nemine ipse iudicare debeat». (Que não seja julgado por nada).
XX. «Quo nullus audeat condemnare apostolicam sedem apellantem». (Que nada pode condenar quem apela a Sede Apostólica).
XXI. «Quod maiores cause cuiscunque ecclesie ad eam referri debeant». (Que as causas maiores de qualquer igreja sejam referidas à sede apostólica).
XXII. «Quod Romana ecclesia nunquam erravit nec imperpetuum scriptura testante errabit».(Que a Igreja Romana nunca errou e não errará nunca, segundo testemunho das Escrituras).
XXIII. «Quod Romanus pontifex, si canonice fuerit ordinatus, meritis beati Petri indubitanter efficitur sanctus testante sancto Ennodio Papiensi episcopo ei multis sanctis patribus faventibus, sicut in decretis beati Symachi pape continetur». (Que o Pontífice Romano, uma vez ordenado canonicamente, é santificado indubitavelmente pelos méritos do bem-aventurado Pedro, segundo testemunho do santo bispo Enódio de Pavia, apoiado pelos muitos santos Padres segundo está nos decretos do Beato Papa Símaco).
XXIV. «Quod illius precepto et licentia subiectis liceat accusare». (Que por ordem e permissão sua seja lícito aos subordinados formular acusações).
XXV. «Quod absque synodali conventu possit episcopus deponere et reconciliare». (Que pode depor e restabelecer os bispos mesmo fora de reuniões de sínodo).
XXVI. «Quod catholicus non habeatur, qui non concordat Romane ecclesie». (Que ninguém seja chamado católico se não concorda com a Igreja Romana).
XXVII. «Quod a fidelitate iniquorum subiectos potest absolvere». (Que ele pode eximir os súditos) .
No momento em que um papa renuncia e outro é eleito por um colégio eleitoral com apenas 115 cardeais votantes, a opinião pública mundial divide-se diante do significado desses acontecimentos e nunca fica indiferente.
Na arena católica, o poder fraciona-se, assimetricamente, entre pelo menos sete polos: 1) o polo pontifício; 2) polo cardinalício; 3) o polo episcopal-clerical, representado pelos bispos e pelos demais clérigos; 4) o polo burocrático-central, concentrado na Cúria Romana; 5) o polo das ordens e das congregações religiosas; 6) o polo dos leigos e dos movimentos; 7) o polo da sociedade civil intra-eclesiástica.
O polo pontifício
O polo pontifício é o principal ponto de referência da Igreja Romana. O papa é, ao mesmo tempo, o bispo de Roma e o “primus inter pares” no conjunto do episcopado mundial.
O Código do Direito Canônico, promulgado em 28 de janeiro de 1983 (e que representa a lei fundamental da Igreja), define o papa como sucessor do apóstolo Pedro, “cabeça do colégio dos Bispos, Vigário de Cristo e Pastor da Igreja Universal, tendo, em virtude de sua missão, o poder ordinário, supremo, pleno, imediato e universal, que pode sempre exercer livremente” (Can. 333).
A ele compete dirigir o Colégio dos Bispos em sua condição de “sujeito de poder supremo e pleno” (Can 336). O colégio ou corpo episcopal “não pode ser exercido senão com o consentimento do romano pontífice”.
Dentro e fora da Igreja Romana, a instituição do papado continua a ser influente inclusive como um fenômeno midiático. O núcleo originário da ação pastoral do papa sempre esteve marcado por determinadas circunstancias históricas, que o modificaram. Originariamente, o papa exercia o seu ministério em sua condição de bispo da Igreja local de Roma. Não havia um modelo pontifício único.
Em seu conflito com o imperador germânico, o Papa Gregório VII apontou, no documento “Dictatus Papae” , em 1075, alguns poderes pontifícios : “nenhum texto canônico existe fora de sua autoridade; sua sentença não pode ser reformada por ninguém e ele sozinho pode reformar a sentença de todos; ele não deve ser julgado por ninguém”.
O Concilio Vaticano II definiu, como prerrogativas do papa, a sua jurisdição universal imediata, ordinária, plenária e suprema e a sua infalibilidade quando fala “ex cathedra”. Ou seja, quando fala na sua condição de Pontífice Romano, como pastor e como doutor.
Quanto aos títulos, o papa, como já foi dito, é o bispo de Roma, o chefe da Igreja, o sumo pontífice (nome herdado do “Pontifex maximus”, do Império Romano); o vigário de Cristo e soberano do Estado da Cidade do Vaticano. Ele possuía também o título de Patriarca do Ocidente, abolido no governo de Paulo VI.
Texto do “Dictatus Papae”, de 1075:
I. «Quod Romana ecclesia a solo Domino sit fundata». (Que a Igreja Romana foi fundada somente pelo Senhor).
II. «Quod solus Romanus pontifex iure dicatur universalis». (Que só o Pontífice Romano seja dito legitimamente universal).
III. «Quod ille solus possit deponere espiscopus vel reconciliare». (Que só ele possa depor ou repor bispos).
IV. «Quod legatus eius omnibus episcopis presit in concilio etiam inferioris gradus et adversus eos sententiam depositionis possit dare». (Que os seus legados, ainda que de grau inferior, em um concílio estão acima de todos os bispos, e pode contra estes pronunciar sentença de deposição).
V. «Quod absentes papa possit deponere» (Que o Papa possa depor ausentes).
VI. «Quod cum excommunicatis ab illo inter cetera nec in eadem domo debemus manere». (Que com os excomungados pelo Papa não podemos, entre outras coisas, permanecer na mesma casa).
VII. «Quod illi soli licet pro temporis necessitate novas leges condere, novas plebes congregare, de canonica abatiam facere et e contra, divitem episcopatum dividere et inopes unire». (Que só a ele é lícito, segundo necessidade temporal, ditar novas leis, formar novas comunidades, converter uma fundação em abadia e, reciprocamente, dividir uma diocese rica e reunir dioceses pobres).
VIII. «Quod solus possit uti imperialibus insigniis». (Que só ele possa levar as insígnias imperiais).
IX. «Quod solius pape pedes omnes principes deosculentur». (Que todos os príncipes devem beijar os pés do Papa).
X. «Quod illius solius nomen in ecclesiis recitetur». (Que o seu nome deve ser recitado em toda igreja).
XI. «Quod hoc unicum est nomen in mundo». (Que este nome é único no mundo).
XII. «Quod illi liceat imperatores deponere». (Que lhe seja lícito depor os imperadores).
XIII. «Quod illi liceat de sede ad sedem necessitate cogente episcopos transmutare». (Que lhe seja lícito trasladar bispos de uma sede para outra, se lhe obrigar a isso a necessidade).
XIV. «Quod de omni ecclesia quocunque voluerit clericum valeat ordinare». (Que possa ordenar clérigos de qualquer igreja onde queira).
XV. «Quod ab illo ordinatus alii eclesie preesse potest, sed non militare; et quod ab aliquo episcopo non debet superiorem gradum accipere». (Que um ordenado por ele possa presidir a outra igreja, mas não servi-la; e que o ordenado por ele não possa receber grau superior de outro bispo).
XVI. «Quod nulla synodus absque precepto eius debet generalis vocari». (Que nenhum sínodo se chame universal se não for por ordem do Papa).
XVII. «Quod nullum capitulum nullusque liber canonicus habeatur absque illius auctoritate». (Que nenhum capítulo nem nenhum livro seja considerado como canónico sem sua autorizada e permissão).
XVIII. «Quod sententia illius a ullo debeat retractari et ipse omnium solus retractare possit». (Que suas sentenças não sejam retratadas por ninguém e só ele possa revê-la).
XIX. «Quod a nemine ipse iudicare debeat». (Que não seja julgado por nada).
XX. «Quo nullus audeat condemnare apostolicam sedem apellantem». (Que nada pode condenar quem apela a Sede Apostólica).
XXI. «Quod maiores cause cuiscunque ecclesie ad eam referri debeant». (Que as causas maiores de qualquer igreja sejam referidas à sede apostólica).
XXII. «Quod Romana ecclesia nunquam erravit nec imperpetuum scriptura testante errabit».(Que a Igreja Romana nunca errou e não errará nunca, segundo testemunho das Escrituras).
XXIII. «Quod Romanus pontifex, si canonice fuerit ordinatus, meritis beati Petri indubitanter efficitur sanctus testante sancto Ennodio Papiensi episcopo ei multis sanctis patribus faventibus, sicut in decretis beati Symachi pape continetur». (Que o Pontífice Romano, uma vez ordenado canonicamente, é santificado indubitavelmente pelos méritos do bem-aventurado Pedro, segundo testemunho do santo bispo Enódio de Pavia, apoiado pelos muitos santos Padres segundo está nos decretos do Beato Papa Símaco).
XXIV. «Quod illius precepto et licentia subiectis liceat accusare». (Que por ordem e permissão sua seja lícito aos subordinados formular acusações).
XXV. «Quod absque synodali conventu possit episcopus deponere et reconciliare». (Que pode depor e restabelecer os bispos mesmo fora de reuniões de sínodo).
XXVI. «Quod catholicus non habeatur, qui non concordat Romane ecclesie». (Que ninguém seja chamado católico se não concorda com a Igreja Romana).
XXVII. «Quod a fidelitate iniquorum subiectos potest absolvere». (Que ele pode eximir os súditos) .
Fotos: Vaticano
FONTE: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21766
Nenhum comentário:
Postar um comentário