A cena mudou quando, no início dos anos 80, Victor Civita – num gesto que se tornaria inspirador para muitos empreendedores brasileiros – se afastou dos negócios no gozo de saúde e lucidez e dividiu-os entre os dois filhos, Roberto, o primogênito, e Richard.
Roberto ficou com o pedaço principal, as revistas. E seu envolvimento com elas foi muito mais intenso, muito mais apaixonado e muito mais complexo do que o de seu pai.
Isso trouxe coisas boas e coisas ruins. Um dono que ama visceralmente o negócio dá à comunidade um sentimento de orgulho considerável: estamos fazendo uma coisa incrível. Somos parte de um tremendoprojeto.
Mas há, por outro lado, uma inevitável ocupação de um espaço que estava livre. Roberto Civita acabou pegando as revistas para si, sobretudo a Veja – com a qual ele teve uma relação de amor total, incondicional, à prova de tudo, como se fossem ambos Romeu e Julieta.
Com isso, o papel dos editores profissionais foi se tornando menor. Entendo que reside aí a explicação do que aconteceu nos últimos anos na Veja.
Depois de duas grandes gestões, a de Mino Carta, primeiro, e a de JR Guzzo e Elio Gaspari depois, a Vejaacabaria sendo entregue a editores que, limitados, não fizeram os contrapontos indispensáveis a Roberto Civita. E no caso de RC o contraponto era crucial: ele não era um editor natural como, por exemplo, Henry Luce, o criador da Time. Ele era, acima de tudo, um animador.
Curiosamente, o que houve acabou sendo a negação a uma máxima que RC gostava de repetir: “Uma revista é seu editor”.
A falta de contraponto acabaria levando a duas calamidades editoriais que destruiriam a aura de equilíbrio e pluralidade que foi a grande marca da Veja em seus anos de ouro.
Primeiro foi Diogo Mainardi, com sua selvagem caça a Lula, a quem chamava de sua “anta”. No começo dos anos 2000, Mainardi mainardizou a Veja. O espírito intolerante e brutal de sua coluna como que se espalhou pela revista.
O serviço seria completado por Reinaldo Azevedo, com seu blog raivoso, extremista, no qual a “anta” foi substituída pelo “apedeuta”.
Um bom editor teria percebido logo os estragos provocados por ambos, e teria alertado RC sobre as infrações ao jornalismo decente dos dois. Num certo momento, a Veja, por Azevedo, estava chamando Luis Nassif de ‘nassífiles’, o que era inimaginável antes.
Cada um a seu jeito, Mainardi e Azevedo contaminaram a maneira de ver o mundo da Veja – e também a maneira como o mundo vê a Veja.
Editores mais fortes teriam impedido a ação corrosiva de Mainardi e Azevedo.
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