Especialistas ouvidos pelo R7 não descartam que a ameaça seja real
Sensação de insegurança da população é provocada pela escalada da violência e por dúvidas sobre a capacidade das polícias
O R7 apresenta nesta semana uma série de reportagens sobre o toque de recolher em São Paulo. Juristas admitem que a ameaça é verdadeira em alguns casos. Professor de direito da Fundação Getulio Vargas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Theodomiro Dias Neto avalia que as regiões com taxas de violência mais altas no Estado são as mais suscetíveis ao toque de recolher. Ele não descarta que, em algumas situações, a coação seja real.
— Neste momento de pânico social, você dá margem para esse tipo de histeria coletiva, esse medo que as pessoas sentem. Você pode ter situações em que, de fato, territórios controlados por determinadas facções criminosas sejam alvo de um toque de recolher. E há outras situações em que a mera difusão de um boato provoca um efeito enorme de geração de pânico na população.
O especialista em segurança pontua que é muito difícil conter a informação que corre no “boca a boca” e cita um exemplo ocorrido há seis anos, durante os ataques promovidos pela facção criminosa que atua a partir dos presídios de São Paulo.
— A população tem dificuldade de averiguar o quanto é um fato concreto, um fato real ou não. Na dúvida, ela aceita o toque de recolher para evitar um dano maior. Eu lembro de 2006, quando em São Paulo, num determinado dia, correu uma informação de que haveria uma série de ataques do PCC. A cidade, em um espaço de duas, três horas, esvaziou completamente. Foi impressionante.
Incisivo, o jurista e professor Luiz Flávio Gomes considera o toque de recolher em São Paulo "uma realidade”. Na análise do cientista criminal, esse tipo de ação criminosa ganha espaço pela ausência de um Estado que garanta uma vida regular.
— Alguém está mandando o toque de recolher. Uns dizem que são policiais. Outros, que são criminosos. Não importa quem está fazendo. Quem está fazendo está contra as leis brasileiras... Portanto, é um absurdo o Estado não garantir a liberdade das pessoas.
Para Gomes, a negação do poder público em relação ao toque de recolher é uma forma de não admitir fraqueza e de não provocar pânico na sociedade.
— O Estado nega o fato, assim como já negou a existência do PCC. Faz isso para não assustar a população, mas não é correto. Nega os fatos e, daqui a pouco, eles são provados. Com isso, perde a credibilidade.
Convergências com 2006
O professor de direito Theodomiro Dias Neto vê convergências entre o contexto dos ataques de 2006 e o atual, mas enfatiza que as proporções são distintas.
— A escala daquele caso foi maior, mas há situações semelhantes, situações de policiais sendo mortos e de aumento abrupto do nível de homicídios, em uma onda que é contrária à tendência que vinha ocorrendo, que era uma tendência de redução. São Paulo vinha numa evolução muito positiva na última década. De repente, os números voltam a crescer em um espaço de dois meses. Nesse aspecto, guarda semelhanças.
Para o jurista, a forma como a sociedade reage a esse pânico pode ser consequência de uma credibilidade maior ou menor em relação ao trabalho da polícia.
— Neste momento em que há um número enorme de homicídios, a população está insegura diante da capacidade da polícia de garantir segurança. Ela se torna mais suscetível, mais fácil de ser influenciada por esse tipo de ameaça [toque de recolher], principalmente, nas zonas de alta violência.
Na avaliação dele, para a situação voltar ao normal, será necessária a “competência dos órgãos de segurança pública na gestão do conflito”. O professor considerou "absolutamente promissor" o discurso de posse do novo secretário de Segurança do Estado, Fernando Grella.
— Essa situação precisa ser gerida com uma repressão inteligente, com transparência e com respeito à legalidade pela polícia. Ele (Grella) começou muito bem. A mensagem dele foi muito clara. Quando ele destaca que é preciso respeito à legalidade, que é preciso aproximação com a sociedade civil, ele está transmitindo a mensagem correta.
Procurada pelo R7, a Polícia Militar esclarece que "em virtude dos últimos acontecimentos relacionados à segurança pública, pessoas mal-intencionadas criam boatos para desestabilizar e amedrontar a sociedade".
Ana Cláudia Barros, do R7
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